terça-feira, 8 de setembro de 2020

A contribuição dos varegues para a formação do Estado Feudal na antiga Rússia



A contribuição dos Varegues na formação do Estado Medieval Russo:

Os varegues eram comerciantes, ou conquistadores, de descendência viking e escandinava, vindos da região do Mar Báltico, e que ocuparam grandes porções de terras nas planícies da Rússia Ocidental, particularmente nas regiões atuais da Bielorrússia e da Ucrânia, e que contribuíram para a formação das bases do Estado Medieval da antiga Rússia. Eles deram origem às dinastias Rurik e Romanov, que governou a Rússia por muitos séculos.

A preocupação maior dos vikings e veregues era criar rotas comerciais e abrir caminho, desde o Mar Báltico, até as ricas regiões do sul da Ucrânia, onde estavam as colônias do grande Império Bizantino e também os ricos Califados Árabes. Eles desenvolviam atividades de comercio e pirataria, pois tinham no sangue, e na sua cultura, as tradições dos povos vikings, terríveis guerreiros e navegadores escandinavos da Idade Média.
Para atingir os seus objetivos, os varegues começaram ocupando a região de Novogardia, no norte da Rússia, no litoral do Mar Báltico, onde fundaram a cidade de Novogardia Magna. Depois, foram descendo pelas planícies da Rússia Ocidental até alcançarem os vales dos rios Volga e Dnieper. O uso de navios de baixo calado, dos vikings, facilitou o avanço pelos rios desta região. Eles foram bem recebidos pelos nativos eslavos do norte da Rússia, pois eles precisavam de guerreiros combativos para impor ordem na região.

Posteriormente, eles procuraram dominar as antigas rotas comerciais que ligavam várias cidades do litoral do Mar Báltico, na Escandinávia, com as colônias gregas do Mar Negro e do Mar Cáspio. Assim, sem saber, eles fizeram a ligação de dois mundos diferentes, ligando a Europa Medieval com as desenvolvidas cidades comerciais do grande Império Bizantino e dos ricos Califados Árabes. Eles passaram a controlar as estradas e os rios que se dirigiam para o sul. Aos poucos, os veregues foram criando importantes reinos por onde passavam, como os famosos Principado de Quieve e o Principado de Volínia, e introduzindo a sua cultura e modo de vida por toda aquela região que foram dominando.

O primeiro rei destes principados foi Rodrigo Rurik, um veregue viking responsável pela criação da famosa Dinastia Rurik, que governou estas terras da Rússia desde o ano de 862 depois de Cristo, até o ano de 1605, quando foi substituída pela Dinastia dos Romanov, uma dinastia que também tinha laços de parentesco com os antigos comerciantes veregues. A Dinastia Romanov governou a Rússia até 1917, quando foi deposta pela Revolução Socialista Bolchevista, que procurou modernizar o país.
O filho de Rurik foi Olegue de Quieve, o qual continuou o trabalho de seu pai e ajudou a implantar um Estado Medieval na antiga Russia, que durou praticamente até o final do Século XIX! No final do século XIX as grandes cidades da Rússia já tinham uma vida moderna, mas, as aldeias do campo ainda estavam submetidas a um tipo de dominação medieval, exercida pelos antigos nobres e grandes proprietários de terras. A história desta antiga região da Ucrânia é muito rica e contém episódios bastante interessantes!


Graças a um intenso comércio feito pelos veregues com as colônias do Mar Negro, e também graças a algumas guerras para conquistas territoriais, o Principado de Quieve se desenvolveu muito, e deu origem ao poderoso Reino de Quieve, que englobou também outros principados e deu origem à "Rússia de Quieve".
O Reino de Quieve conseguiu englobar grandes extensões de terras, que iam desde o litoral do Mar Báltico até as margens do Mar Negro, onde ficavam as antigas colônias fundadas pelos gregos.
Os varegues da Dinastia Rurik, do Reino de Quieve, fizeram as chamadas Guerras Russo-Bizantinas, contra o Império Bizantino e a cidade de Constantinopla. Isto resultou em alguns tratados que lhes deu vantagens comerciais importantes.
A cidade de Constantinopla era muito difícil de ser conquistada, porque os bizantinos detinham o conhecimento da fabricação e utilização do chamado “Fogo Grego”, que era uma espécie de combustível que podia ser jogado nos inimigos, através de uma espécie de sifão, (um tipo de lança-chamas).

A Marinha Bizantina era muito respeitada, por causa do uso do Fogo Grego contra os navios inimigos! Ninguém sabe ao certo como era fabricado o Fogo Grego, um segredo militar, mas, alguns estudiosos acham que ele era feito de várias substâncias incendiárias misturadas, tais como, betume, resina de pinheiro, nafta, óleo, azeite, etc. Na verdade, o Fogo Grego era um certo tipo de “gasolina incendiária”!
Uma lenda russa diz que Santo André navegou pelo Mar Negro e esteve na colônia grega de Quersoneso Taurica, na Península da Criméia, onde evangelizou diversas pessoas. Uma segunda parte desta lenda diz que Santo André resolveu subir o Rio Dnieper, até a região onde seria construída a cidade de Quieve. Nesta região, ele teria erguido uma cruz, numa colina, e feito uma profecia: a de que ali seria o berço do cristianismo em terras eslavas!

Verdade ou não, o fato é que Santo André, que era o irmão mais velho de São Pedro, viajou para a Grécia, onde formou uma forte comunidade cristã, perto da cidade grega de Patras. Em Patras ele ainda se desentendeu com os administradores daquela cidade, e foi condenado a morrer crucificado, numa cruz em forma de “X”, no ano de 60 depois de Cristo. Existe uma bonita igreja, na montanha em que Santo André esteve, na atual Kiev, chamada Igreja de Santo André.
Depois da morte de Santo André, o Imperador Constantino mandou transladar os seus restos mortais para Constantinopla. Mas, algumas das suas relíquias foram levadas para Roma, onde ficaram guardadas na Catedral de Amalfi.
A Ucrânia é hoje um país muito religioso, mas, considerando-se a índole guerreira do povo viking, somente uma religião como o cristianismo, que pregava a paz e a benevolência, é que poderia colocar um pouco mais de tranquilidade naquela conturbada região da Rússia, durante esta fase da Idade Média.

Uma outra pessoa muito cristã foi a Rainha Olga Prekrasa, do Reino de Quieve, que era descendente do Príncipe Rurik. Olga era uma mulher muito boa, generosa e caridosa. Por isso, foi santificada mais tarde, e passou a ser conhecida como Santa Olga.
O filho de Olga, Sviatoslav I, não seguiu os seus passos, e preferiu ficar cultuando os antigos deuses dos veregues, importados da região da Escandinávia, tais como Perun, (Perunú), o deus do trovão e da tempestade, mais conhecido atualmente como Thor! Ele não gostava de ficar muito na Corte, preferindo fazer excursões de conquistas em outras regiões da Europa.
O neto de Santa Olga foi Vladimir I, dito “O Grande”. Ele era filho de Sviatoslav com uma escrava chamada Malusha. Ela vivia dentro de uma caverna, mas, foi levada até a Corte do Reino de Quieve para fazer profecias. Foi na corte que Malusha conheceu o rei Sviatoslav, com quem teve um romance, que resultou no nascimento de Vladimir.

Vladimir, o filho bastardo do rei de Kiev com a escrava Malusha, foi morar na Escandinávia, onde formou um exército. Depois, ele voltou para o sul, onde conseguiu conquistar o Reino de Quieve.
Num primeiro momento, assim como aconteceu com seu pai, Vladimir também passou a cultuar as antigas divindades escandinavas. Depois, resolveu seguir mais para o sul, para invadir as colônias gregas, tais como a colônia de Quersoneso, o mesmo lugar onde Santo André também esteve, fazendo a evangelização da população. Quersoneso ficava no sul da Península da Criméia e, hoje em dia, é conhecida pelo nome de Sebastopol. Em Quersoneso Vladimir sofreu a influência da cultura bizantina, e também do cristianismo ortodoxo, adotado em Constantinopla.
Vladimir tinha o desejo de se casar com Anna Porfirogênita, irmã do Imperador Basílio II, de Constantinopla. Basílio era apelidado de Bulgaroctono, que quer dizer “matador de búlgaros”.

Basílio II disse que concederia a mão da sua irmã desde que Vladimir adotasse o cristianismo como religião! Basílio também lhe pediu que introduzisse o Cristianismo Ortodoxo nas terras da região de Quieve. 
Vladimir sabia que Basílio queria fazer uma aliança com o já poderoso Reino de Quieve. A princípio não gostou muito da ideia de abandonar os seus deuses escandinavos, mas, depois entendeu que os povos varegues e eslavos precisavam ser catequizados. Assim, resolveu concordar com a ideia de ser batizado e acabar com aquela sua vida de guerreiro rebelde viking.
Vladimir I foi batizado no ano de 988 depois de Cristo, quando também se casou com a Princesa Anna. Na verdade, este casamento representou um acordo para a união de Constantinopla com a Dinastia Rurik e o Reino de Quieve. 
Isto permitiu ao Imperador Basílio II ter o auxílio das fortes forças do Exército Varegue, para garantir a segurança da sua cidade. Basílio passou a ter até uma guarda pessoal, formada por guerreiros vikings, chamada de “Guarda Varegue”.
Vladimir voltou para Quieve, onde deu início à sua obra de evangelização dos varegues, eslavos e demais habitantes das planícies da Rússia de Quieve. Ele foi o responsável pela entrada do Cristianismo Ortodoxo na Rússia.

Vladimir teve algumas esposas e, ao todo, 12 filhos! Mas, aos poucos, foi deixando sua antiga vida de viking e se adaptando à filosofia cristã. Mais tarde Vladimir, assim como aconteceu com sua avó Olga, foi canonizado pela Igreja Ortodoxa, e recebeu o nome de São Vladimir. No local do seu batismo, em Sebastopol, na Criméia, fica hoje a Igreja de São Vladimir.
A tomada de Quersoneso pelas forças do Reino de Quieve, permitiu que os eslavos e os descendentes dos antigos veregues tivessem passagem livre e definitiva para o Mar Negro e para as colônias do Império Bizantino, garantindo assim seu acesso aos produtos e riquezas do vantajoso comércio com o Oriente Médio.
Vladimir I permaneceu como rei da Rússia de Quieve até agosto de 1015, quando faleceu. No processo sucessório, um dos seus filhos, Jaroslau, (Yaroslav), acabou se destacando, e assumiu o trono em 1019, com o nome de Jaroslau I, conhecido como “O Sábio”.

Durante o governo de Jaroslau I, que durou até 1054, a Rússia de Quieve atingiu o auge do seu crescimento cultural e poder militar. Jaroslau criou o primeiro Código de Leis Eslavas-Orientais, chamado de Russkaia Pravda. O Código de Leis foi divulgado entre a população do reino e representou a primeira tentativa de colocar uma ordem jurídica na sociedade eslava da Rússia de Quieve.
Jaroslau (ou Yaroslav) casou-se em 1019 com a filha do Rei Olavo, da Suécia, chamada Ingegerda e apelidada em Quieve de “Irene”. 
Assim, o Reino de Quieve consolidou o seu domínio por todo o interior da atual Rússia Ocidental. Mais tarde, Ingegerda também foi santificada, e ficou conhecida pelo nome de Santa Ana.

Durante todo o Século XII os varegues, descendentes dos conquistadores vikings, foram sendo cristianizados e assimilados pelos diversos povos eslavos daquela grande região da Rússia. Apesar de ser um período de servidão da Idade Média, este foi um século em que o povo pode desfrutar de uma relativa paz, sem muitas lutas, principalmente no campo, onde a vida caminhava de maneira tranquila e bucólica.
De vez em quando, o Reino de Quieve sofria ataques dos povos do leste, mas nada que se comparasse com as terríveis invasões dos tártaros e mongóis, que aconteceram no começo do Século XIII, quando o Reino de Quieve já estava começando o seu declínio político-militar. No final do Século XII os Principados da Rússia de Quieve começaram a sofrer os primeiros ataques das tribos vindas do leste, do interior da Ásia, como os tártaros. 

Por sua vez, os tártaros já estavam sendo pressionados pelos hábeis guerreiros mongóis que, montados em seus pequenos cavalos, e armados com seus famosos arcos curvos, espalhavam o terror e faziam crueldades por onde passavam. Por outro lado, as armas pesadas, usadas pelos antigos varegues, tais como o machado de combate, ainda eram usadas pelas forças da Rússia de Quieve. A força física já não era tão necessária no campo de batalha e, as novas táticas militares, misturando rapidez e agilidade, começaram a ter mais destaque. As táticas de ataque e retirada das guerrilhas orientais passaram a ser amplamente utilizadas para derrotar exércitos "pesados" e sem mobilidade.

Assim, no começo do Século XIII, em 1223, houve uma grande batalha, nas margens do Rio Kalka, onde as forças dos principados da Rússia de Quieve foram derrotadas pelas hordas improvisadas dos guerreiros vindos do leste.

Esta derrota mostrou a fragilidade do poder militar ultrapassado dos varegues e eslavos. Os tártaros tinham mais mobilidade e podiam atingir os seus inimigos com flechas disparadas de longe! Isto serviu de estímulo para Batu Khan, neto de Gengis Khan, montar e treinar um grande exército, formado por cerca de 25.000 cavaleiros arqueiros, para invadir a Europa, no ano de 1236.

Em fevereiro de 1238, as hordas de guerreiros mongóis, sob o comando do general Subutai, (ou Subedei), sitiaram a cidade de Vladimir, vizinha da região de Quieve. Isto mostrou que a tomada do outrora poderoso Reino de Quieve era apenas uma questão de tempo!
Os mongóis tomaram e incendiaram muitas cidades da Rússia, matando muitas pessoas. Eles vinham com táticas simples mas eficientes de combate e, aos poucos, foram vencendo as batalhas e tomando as cidades da Rússia de Quieve.

As batalhas foram terríveis e duraram até o ano de 1242, com a vitória do exército de ocupação dos mongóis.
Como resultado, os principados da Rússia tiveram que pagar tributos anuais aos mongóis e prestar vassalagem para a “Horda Dourada”, criada por Batu Khan. Os mongóis preferiram organizar a sua capital em Moscou, sendo que Quieve foi cercada, invadida e saqueada! 

Muitas das tropas invasoras eram islamitas, e adotavam o culto a Alá e ao Profeta Maomé! O seu livro sagrado era o Alcorão. Mas, eles não obrigaram a população dominada a seguir o islamismo, permitindo que eles continuassem com os seus costumes e religião.

Os antigos principados continuaram a existir, mas, alguns deles tiveram a sua liderança política substituída por militares indicados pela Horda Dourada, a organização militar, criada por Batu Khan, que tinha a sua liderança em Moscou.
Os dois últimos principados a se render foram os de Novogardia e Pescova, que preferiram não lutar, diante da superioridade tática e bélica do inimigo. Os mongóis também invadiram a Península da Criméia, a Hungria e a Polônia. Seu domínio sobre a Europa durou até o ano de 1480. 

Os mongóis criaram um sistema de cobranças anual de impostos da população dominada. Os fiscais e representantes do governo percorriam as aldeias para fazer a cobrança e enviar ao governo centralizado na cidade de Moscou, onde estavam os representantes da Horda Dourada, apesar do comando e liderança central da Horda estar localizado na China. 
Hoje em dia, os tártaros e descendentes dos antigos mongóis ainda vivem em algumas regiões do Cazaquistão e do Uzbequistão,mas, também houve uma certa miscigenação das raças, fato que deu origem ao atual povo da Rússia.
Assim, terminou tristemente a grande influência que os antigos comerciantes vikings e varegues exerceram sobre a grande região da Rússia de Quieve.

Quanto ao Império Bizantino, este foi se enfraquecendo e finalmente caiu, frente aos Turcos Otomanos, no ano de 1453, pondo fim ao Período da Idade Média na Europa, e prenunciando o começo da Idade Moderna e do Período Humanista Renascentista!

   Guerreiro mongol armado com um arco pequeno e a espada de lâmina curva.

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